terça-feira, 22 de setembro de 2009

Defeitos


Três décadas e meia depois (os mais optimistas diriam que mais vale tarde que nunca), descobri uma triste e avassaladora verdade em mim – é que sou uma pessoa cheia de defeitos. Tenho mais defeitos do que alguma vez julguei ter, que alguma vez julguei ser possível. Acho aliás que cada ano (para não dizer dia) que passa descubro mais defeitos em mim. Como se nascessem do nada, como se brotassem do simples acto de respirar. São os gremlins da minha existência, o meu acne. Pois é, por muito que me custe admitir, nem sempre a verdade veste Pierre Cardin, Dior ou Prada (em alusão ao filme). É mesmo assim. Habitualmente, e por mera cortesia, refiro-me aos defeitos dos outros como meras características, marcas de personalidade. Sempre achei este rótulo clean, soft, menos grotesco. Dizê-lo assim faz-me sair bem na fotografia, dá-me um ar delicado, civilizado, o que de todo não sou. É como limpar o chão com panos da seda mais nobre. Mas comigo não. Não senhora! Comigo não precisa de ser assim, porque eu não sou assim. Comigo não preciso de usar rendas ou rendinhas, laços ou mocassins. Não careço de eufemismos ou de palavras doces servidas em tabuleiros dourados. Abomino esses rendilhados típicos da corte. Não! Simplesmente não! Porque eu sou plebe. Comigo cuspo para o chão e arroto a plenos pulmões. Comigo sento-me num tronco de uma árvore a devorar um frango meio vivo. A besta mora em mim e mora em mim porque lhe dou sustento, porque a alimento com a minha carne, com as minhas vísceras. Assim sou. Cheio de bichos e parasitas, a tresandar de defeitos. Não serei certamente o único, mas isso de nada me vale.

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