Artigo sobre os blogues das mamãs, escrito por Kátia Catulo (segundo ela, estes blogues são mais que as mães e servem para tudo), publicado hoje, no site do Jornal I. Cá vai:
"Ricardo descobriu mais uma palavra para juntar ao seu vocabulário: "especialmente" surge em todas as frases, em qualquer altura e com as sílabas bem soletradas. Sara largou a chucha, quer comer sozinha e diz a torto e a direito que já é "crescida". Beatriz tem uma resposta sempre pronta na hora de a convencer a fazer os trabalhos da escola, desligar a televisão ou ir para a cama. Todos os dias há novas traquinices de miúdos para conhecer. Dores de dentes, arrotos, birras ou cocós na fralda estão registados nos baby-blogues. São como bonecas russas. Dentro de um está outro, e dentro do outro está sempre mais um.Os blogues de família têm mais usos do que um canivete suíço. Servem de diários terapêuticos, intercâmbios de experiências, álbuns de recordações. Todas as noites há dezenas e dezenas de mamãs (e uns quantos papás) que se sentam frente ao computador e teclam desabafos, proezas dos filhos ou ansiedades de gravidez.São as heranças digitais que os adultos querem deixar aos seus descendentes. "Uma espécie de livro" que Flora Rodrigues começou a escrever há três anos para a Bárbara e a que chamou de "Crónicas de Uma Mãe Atrapalhada". Ou "um álbum de fotografias, mas feito de palavras" que João Sá construiu no Belogue dos Meus Filhos, um projecto de longo prazo: "Daqui a duas ou três décadas (partindo do princípio de que ainda se lerá) talvez eles achem piada ?reouvirem--se? pelas palavras, já que no caso dos diálogos transcrevo-os linearmente."Só que, na maioria dos casos, os blogues das mamãs e dos papás acabaram por ser mais do que um arquivo de memórias. Mães de qualquer ponto do país trocam experiências e descobrem que as angústias da maternidade não se restringem a uma só casa: "Ao ler os outros blogues de famílias fico mais descansada ao saber que as birras não acontecem só com as minhas filhas", confidencia Carla Silva, que prefere não divulgar o seu baby-blogue para proteger a sua intimidade.E há até os que encontraram no seu blogue formas de fazer psicanálise sem ter de pagar fortunas por cada consulta: "Sou melhor mãe ao escrever e descrever a minha experiência porque quando escrevo, auto-analiso-me e aprendo muito sobre mim e sobre os meus filhos", conta Rita Quintela, autora do blogue Mãe Galinha. É o efeito mais instantâneo que um baby-blogue pode ter sobre os pais, mas há também uma segunda etapa que, mais tarde ou mais cedo, acaba por chegar: "Ao fim de algum tempo de trocas de experiências mútuas, começamos a sentir necessidade de conhecermos quem está do outro lado", conta Flora Rodrigues. E assim nascem novas amizades para partilhar aniversários, férias ou jantares de família: "Alguns dos meus melhores amigos são aqueles que conheci pelo facto de escrever no blogue", diz a Rita Quintela. Posts sobre as travessuras dos filhos é sobretudo um vício de mulheres. Encontrar um papá autor de um baby-blogue é uma tarefa complicada. Em cada dez ou 15, há um ou dois que são escritos no masculino. João Sá é uma das aves raras, mas não será por isso que julga ser "um homem em território de mulheres". Pelo contrário, os comentários aos seus posts - que são tanto deles como delas - fazem-no sentir que pertence ao clube. "O facto de me limitar a ser o fiel escrivão daquilo que os meus filhos dizem, retira a carga sexual do meu blogue", explica o autor do Belogue dos Meus Filhos.O certo é que são as mulheres a dominar este universo feito de fraldas, chupetas e outros caprichos. Teorias para isso há muitas. O velho lugar-comum de que eles têm medo de expor os sentimentos e elas serem mais comunicativas é o mais popular entre as mamãs. "Penso que, para os homens, a família constitui uma entidade mais fechada, sobre a sua protecção, e cuja intimidade não convém mostrar por aí", diz Rita Quintela.Homem ou mulher faz pouca diferença na hora de teclar no seu blogue. Escrevem quase todos os dias e, quando isso não acontece, sentem a falta de qualquer coisa. Roubam tempo ao tempo, usam as madrugadas, os fins-de-semana, as férias, ou os intervalos em que os miúdos estão a dormir. Mesmo quando têm quatro filhos para cuidar, "arranjam" uns minutos para blogar. "É uma necessidade", diz Rita Quintela.Se pudessem dedicavam ainda mais horas ao seu blogue. Mas para isso precisam de matéria-prima. A quantidade e qualidade do material que é seleccionado para um baby-blogue não surge apenas da boa vontade ou do empenho dos educadores, mas principalmente da criatividade dos mais novos: "Eu funciono só como uma espécie de editor, decido o que se publica e o que fica de fora", esclarece João Sá. Não há portanto regras, conta o autor do Belogue dos Meus Filhos. Tudo depende daquilo que vai acontecer no momento seguinte: "De repente, um instante, uma conversa, uma resposta, uma pergunta, uma perplexidade, um riso gera-me a vontade de registar esse momento." E surge um post. ".
Achei que devia partilhar este texto com vocês.
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